segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Marcio Jr, Feliz aniversário!

Quando criei minha página no Recanto das Letras, o fiz sem quaisquer pretensões literárias. Foi um meio para publicar alguns rabiscos que escrevo vezenquando e alguma coisa guardada no meu baú.

Num dado momento, recebi um e-mail do Marcio Jr., (um dos primeiros leitores) me incentivando a transformar alguns pensamentos em crônicas, pois segundo ele, havia em mim um potencial de cronista.

Inicialmente relutei, pois achava um pouco de pretensão rotular meus rabiscos como tal, porém após seus argumentos me rendi e os reclassifiquei segundo sua orientação.

Marcio tornou-se um amigo irmão – atualmente está afastado do Recanto, mas mantém seu blog Abismo das Vaidades, diariamente nos presenteia com crônicas e atualmente com poesias apaixonadas e apaixonantes.

Hoje é seu aniversário e meu carinho segue em forma de poesia que peguei emprestada do Ulisses Tavares:

Amizade
Amigo não se guarda apenas
No lado esquerdo do peito.
Como não existe
Meia amizade,
Amigo é proprietário,
Não meeiro,
Se guarda no peito inteiro.
Ulisses Tavares

Para você Márcio, meu carinho, meu agradecimento e meu desejo que a vida lhe acaricie diariamente.
Feliz Aniversário!






P.S. Surpresa organizada pela Ester Marques do Uni ver sos ...

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Para os Amigos Especiais do Recanto

CANÇÃO DO AMIGO
Quando digo
a palavra amigo
minha alma abre os postigos.
Amigo é um código
sem artigos.
É um sentimento
tão mais recente
quanto mais antigo.
Amigo não chega
na hora da colheita.
Vem plantar o trigo. 

Amigo que é amigo
desafia as leis do tempo
e do espaço.
Viaja no vento,
longe,
está contigo.
E sua presença é doce
como os figos. 

Amigo
conhece as confidências
do silêncio.
Ao seu lado
não há maus presságios,
perigos.
O mundo não pode
te ferir,
magoar,
pois tens um amigo.
E o seu abraço
é um abrigo. 

Luiz Coronel

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

O Tsunami do Descaso Governamental




O TSUNAMI DO DESCASO GOVERNAMENTAL
A TRAGÉDIA DA REGIÃO SERRANA DO RIO

Cidadão fluminense, em pouco mais de um ano, três tragédias (Angra dos Reis, Morro do Bumba e Região Serrana) mataram quase 1.000 cidadãos fluminenses.
Querem culpar as chuvas pelas mortes, porém especialistas internacionais e nacionais que se manifestaram sobre o fato declararam que o número de mortes seria muito menor, caso o Rio de Janeiro dispusesse de um sistema de monitoramento de chuvas e de alerta para a população que fossem eficazes.
Diante do exposto nos resta questionar:
Por que o Rio de Janeiro não possui a tecnologia necessária para salvar vidas?
A tecnologia existe, outros países a utilizam, tanto que na Austrália, uma enchente muito pior vitimou apenas 20 cidadãos australianos.
O Rio é o segundo estado em arrecadação no país, nos últimos quatro anos teve total apoio do governo federal, que nunca 1nvestiu tanto no estado, portanto, dinheiro não faltou.
Tanto não faltou que o governador Sérgio Cabral gastou quase MEIO BILHÃO em propaganda política ao longo do seu governo.
Diante dessas verdades, existem indícios de que o DESCASO GOVERNAMENTAL foi um forte determinante para o gigantesco número de mortes.
É hora de AJUDAR, de PREVENIR, de INVESTIGAR e de PUNIR.
Ocorreu em Angra dos Reis, fizemos uma mobilização para AJUDAR as vítimas, mas não para PREVENIR, INVESTIGAR e PUNIR.
Ocorreu novamente no Morro do Bumba, nova mobilização para AJUDAR, mas nada para PREVENIR, INVESTIGAR e PUNIR. Novamente, estamos mobilizados somente para AJUDAR, será que repetiremos o erro?        ­
O nosso protesto é para que a RESPONSABILIDADE DOS DETENTORES DE CARGOS PÚBLICOS (governador, prefeitos, secretários de defesa civil, etc.) seja apurada, com todo rigor e isenção, opinando inclusive pelo afastamento temporário (no período da investigação) de todos para que a isenção seja garantida.
Una-se a nós, não podemos permitir que prossigamos enterrando nossos familiares e amigos, enquanto os políticos continuam saindo ilesos e impunes. Temos que responsabilizá-los, caso sejam culpados, administrativa, penal e civilmente.      
Protestaremos também na ALERJ, no Ministério Público e no Tribunal de Justiça, acompanhem nas redes sociais as datas e os horários.
MOVIMENTO CÍVICO JUNTOS SOMOS FORTES! ­

domingo, 16 de janeiro de 2011

Catarse...

Afilhado
 
Ele foi meu filho emprestado até os 12 anos. Acompanhei a gestação de minha irmã, seu nascimento, a notícia dada pelo médico de que nascera com um problema congênito.

Sofri e chorei durante 1 ano e meio em que usou gesso nas duas pernas até a 1ª cirurgia.

Sofri, mais ainda, quando na operação mal sucedida seus tecidos foram necrosados.

Chorei de alegria quando deu os primeiros passinhos, sem o gesso, usando botinhas ortopédicas.

Aos 5 anos nova cirurgia, levava-o para o parque com gesso nas pernas a fim de que brincasse com um barquinho a motor, seu brinquedo predileto.

Sofri quando constatamos que na 2ª cirurgia cortaram um pedaço do tendão agravando o problema inicial.

Vibrei quando enfrentou com galhardia o deboche cruel de um coleguinha na nova escola.

Vibrei quando se preparava para jogar futebol, embora não pudesse usar outro calçado que não fosse a bota. Percorri várias lojas até encontrar um tipo de tênis que servisse no seu pé para usar somente uma vez na disputa do torneio de futebol.

Acompanhei seu desempenho escolar, suas redações sempre elogiadas, suas medalhas conquistadas pelo excelente desempenho escolar.

Vibrei quando passou para a Escola Técnica Federal e me desdobrei em várias no momento em que precisou fazer uma nova cirurgia, necessitando ficar um período em cadeira de rodas, e como estava cursando o 1º ano não era permitido trancar a matrícula. Corri atrás, na frente, ao lado, procurei orientadores, psicólogos, diretores e consegui que abrissem uma exceção.

Chorei de agradecimento ao Dr. Arnaldo Santiago que com suas mãos mágicas devolveu-lhe o andar normal.

Tinha 12 anos quando engravidei, recebeu a notícia enciumado talvez pensando que a madrinha iria abandoná-lo. A forma que encontrei para abrandar seu ciúme foi participando que ele seria o padrinho do neném.

Clara afirma que eu não poderia ter escolhido um melhor padrinho para ela, se entendem muito bem. Ela cita um trecho da música do Cazuza “Nossos destinos foram traçados na maternidade”, dizendo ser o fundo musical da relação deles. Foi através dele que sua paixão pelo cinema foi despertada.

Na semana passada minha irmã comentou que ele havia sido convidado para ir trabalhar em Angola. Não registrei bem a notícia, achei que era uma coisa para um futuro distante.

Hoje conversamos por telefone e fiquei sabendo que assumirá seu novo posto na próxima semana. A ficha caiu!

Choro um misto de alegria, de saudade, de tristeza. Não consigo identificar esse choro. Sei que será uma nova experiência profissional, terá um melhor salário, um cargo mais elevado, por outro lado sabê-lo tão longe bate uma saudade cheia de antecedência.

Meu afilhado, meu compadre, meu sobrinho, meu amigo, seja feliz na nova caminhada. Eu daqui vou torcer por você. Coração apertado, chorando de saudade, mas vibrando pelo seu sucesso.

Sua dinda.
04/01/11

*Escrito como uma catarse, sem revisão.

 
Regina Coeli Carvalho
Publicado no Recanto das Letras em 07/01/2011
Código do texto: T2715920

**Neste momento ele está voando rumo a Angola, um pedacinho do meu coração viaja junto dele.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Eu acuso...


Os professores deixaram de ser heróis de seus alunos para tornarem-se vítimas. Eu também ACUSO!

Recebi da amiga Ana Campelo e compartilho com vocês o tributo/desabafo.


J’ACUSE !!!
(Eu acuso !)

(Tributo ao professor Kássio Vinícius Castro Gomes)

 "Mon devoir est de parler, je ne veux pas être complice".
("Meu dever é falar, não quero ser cúmplice”)
(Émile Zola)

Foi uma tragédia fartamente anunciada. Em milhares de casos, desrespeito. Em outros tantos, escárnio. Em Belo Horizonte, um estudante processa a escola e o professor que lhe deu notas baixas, alegando que teve danos morais ao ter que virar noites estudando para a prova subsequente. (Notem bem: o alegado “dano moral” do estudante foi ter que... estudar!).

A coisa não fica apenas por aí. Pelo Brasil afora, ameaças constantes. Ainda neste ano, uma professora brutalmente espancada por um aluno. O ápice desta escalada macabra não poderia ser outro.

O professor Kássio Vinícius Castro Gomes pagou com sua vida, com seu futuro, com o futuro de sua esposa e filhas, com as lágrimas eternas de sua mãe, pela irresponsabilidade que há muito vem tomando conta dos ambientes escolares.

Há uma lógica perversa por trás dessa asquerosa escalada. A promoção do desrespeito aos valores, ao bom senso, às regras de bem viver e à autoridade foi elevada a método de ensino e imperativo de  convivência supostamente democrática.

No início, foi o maio de 68, em Paris: gritava-se nas ruas que “era proibido proibir”. Depois, a geração do “não bate, que traumatiza”. A coisa continuou: “Não reprove, que atrapalha”. Não dê provas difíceis, pois “temos que respeitar o perfil dos nossos alunos”. Aliás, “prova não prova nada”. Deixe o aluno “construir seu conhecimento.” Não vamos avaliar o aluno. Pensando bem, “é o aluno que vai avaliar o professor”. Afinal de contas, ele está pagando...

E como a estupidez humana não tem limite, a avacalhação geral epidêmica, travestida de “novo paradigma” (Irc!), prosseguiu a todo vapor, em vários setores: “o bandido é vítima da sociedade”, “temos que mudar ‘tudo isso que está aí’; “mais importante que ter conhecimento é ser ‘crítico’.”

Claro que a intelectualidade rasa de pedagogos de panfleto e burocratas carreiristas ganhou um imenso impulso com a mercantilização desabrida do ensino: agora, o discurso anti-disciplina é anabolizado pela lógica doentia e desonesta da paparicação ao aluno – cliente...

Estamos criando gerações em que uma parcela considerável de nossos cidadãos é composta de adultos mimados, despreparados para os problemas, decepções e desafios da vida, incapazes de lidar com conflitos e, pior, dotados de uma delirante certeza de que “o mundo lhes deve algo”.

Um desses jovens, revoltado com suas notas baixas, cravou uma faca com dezoito centímetros de lâmina, bem no coração de um professor. Tirou-lhe tudo o que tinha e tudo o que poderia vir a ter, sentir, amar.

Ao assassino, corretamente , deverão ser concedidos todos os direitos que a lei prevê: o direito ao tratamento humano, o direito à ampla defesa, o direito de não ser condenado em pena maior do que a prevista em lei. Tudo isso, e muito mais, fará parte do devido processo legal, que se iniciará com a denúncia, a ser apresentada pelo Ministério Público. A acusação penal ao autor do homicídio covarde virá do promotor de justiça. Mas, com a licença devida ao célebre texto de Emile Zola, EU ACUSO tantos outros que estão por trás do cabo da faca:

EU ACUSO a pedagogia ideologizada, que pretende relativizar tudo e todos, equiparando certo ao errado e vice-versa;

EU ACUSO os pseudo-intelectuais de panfleto, que romantizam a “revolta dos oprimidos”e justificam a violência por parte daqueles que se sentem vítimas;

EU ACUSO os burocratas da educação e suas cartilhas do politicamente correto, que impedem a escola de constar faltas graves no histórico escolar, mesmo de alunos criminosos, deixando-os livres para tumultuar e cometer crimes em outras escolas;

EU ACUSO a hipocrisia de exigir professores com mestrado e doutorado, muitos dos quais, no dia a dia, serão pressionados a dar provas bem tranqüilas, provas de mentirinha, para “adequar a avaliação ao perfil dos alunos”;

EU ACUSO os últimos tantos Ministros da Educação, que em nome de estatísticas hipócritas e interesses privados, permitiram a proliferação de cursos superiores completamente sem condições, freqüentados por alunos igualmente sem condições de ali estar;

EU ACUSO a mercantilização cretina do ensino, a venda de diplomas e títulos sem o mínimo de interesse e de responsabilidade com o conteúdo e formação dos alunos, bem como de suas futuras missões na sociedade;

EU ACUSO a lógica doentia e hipócrita do aluno-cliente, cada vez menos exigido e cada vez mais paparicado e enganado, o qual, finge que não sabe que, para a escola que lhe paparica, seu boleto hoje vale muito mais do que seu sucesso e sua felicidade amanhã;

EU ACUSO a hipocrisia das escolas que jamais reprovam seus alunos, as quais formam analfabetos funcionais só para maquiar estatísticas do IDH e dizer ao mundo que o número de alunos com segundo grau completo cresceu “tantos por cento”;

EU ACUSO os que aplaudem tais escolas e ainda trabalham pela massificação do ensino superior, sem entender que o aluno que ali chega deve ter o mínimo de preparo civilizacional, intelectual e moral, pois estamos chegando ao tempo no qual o aluno “terá direito” de se tornar médico ou advogado sem sequer saber escrever, tudo para o desespero de seus futuros clientes-cobaia;

EU ACUSO os que agora falam em promover um “novo paradigma”, uma “ nova cultura de paz”, pois o que se deve promover é a boa e VELHA cultura da “vergonha na cara”, do respeito às normas, à autoridade e  do respeito ao ambiente universitário como um ambiente de busca do conhecimento;

EU ACUSO os  “cabeça-boa” que acham e ensinam que disciplina é “careta”, que respeito às normas é coisa de velho decrépito;

EU ACUSO os métodos de avaliação de professores, que se tornaram templos de vendilhões, nos quais votos são comprados e vendidos em troca de piadinhas, sorrisos e notas fáceis;

EU ACUSO os alunos que protestam contra a impunidade dos políticos, mas gabam-se de colar nas provas, assim como ACUSO os professores que, vendo tais alunos colarem, não têm coragem de aplicar a devida punição;

EU VEEMENTEMENTE ACUSO os diretores e coordenadores que impedem os professores de punir os alunos que colam, ou pretendem que os professores sejam “promoters” de seus cursos;

EU ACUSO os diretores e coordenadores que toleram condutas desrespeitosas de alunos contra professores e funcionários, pois sua omissão quanto aos pequenos incidentes é diretamente responsável pela ocorrência dos incidentes maiores;

Uma multidão de filhos tiranos que se tornam alunos -clientes, serão despejados na vida como adultos eternamente infantilizados e totalmente despreparados, tanto tecnicamente para o exercício da profissão, quanto pessoalmente para os conflitos, desafios e decepções do dia a dia.

Ensimesmados em seus delírios de perseguição ou de grandeza, estes jovens mostram cada vez menos preparo na delicada e essencial arte que é lidar com aquele ser complexo e imprevisível que podemos chamar de “o outro”.

A infantilização eterna cria a seguinte e horrenda lógica, hoje na cabeça de muitas crianças em corpo de adulto: “Se eu tiro nota baixa, a culpa é do professor. Se não tenho dinheiro, a culpa é do patrão. Se me drogo, a culpa é dos meus pais. Se furto, roubo, mato, a culpa é do sistema. Eu, sou apenas uma vítima. Uma eterna vítima. O opressor é você, que trabalha, paga suas contas em dia e vive sua vida. Minhas coisas não saíram como eu queria. Estou com muita raiva. Quando eu era criança, eu batia os pés no chão. Mas agora, fisicamente, eu cresci. Portanto, você pode ser o próximo.”

Qualquer um de nós pode ser o próximo, por qualquer motivo. Em qualquer lugar, dentro ou fora das escolas. A facada ignóbil no professor Kássio dói no peito de todos nós. Que a sua morte não seja em vão. É hora de repensarmos a educação brasileira e abrirmos mão dos modismos e invencionices. A melhor “nova cultura de paz” que podemos adotar nas escolas e universidades é fazermos as pazes com os bons e velhos conceitos de seriedade, responsabilidade, disciplina e estudo de verdade.

Igor Pantuzza Wildmann
Advogado – Doutor em Direito. Professor  universitário.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Bulimia...

Charge de Dominho

Bulimia
Engulo todos os dias
mediocridades
vaidades
hipocrisias!
Pessoinhas fúteis
palavrinhas vãs!
Esperando o final da tarde
quando vomito
toda essa comidinha inútil!!!
Tâmara Rossene


domingo, 2 de janeiro de 2011

O Buraco no muro



"Não quero fazer especulações sobre o que a cultura computacional pode vir a fazer pelas crianças, mas apenas dizer que se o ciberespaço for considerado um lugar, então há pessoas que estão nele, e pessoas que não estão. E parece haver um consenso geral de que tal segregação entre 'cibernéticos' e 'não cibernéticos' é nociva e poderia causar uma divisão. Se for assim, então eu acho que o Buraco no Muro é um método para criar uma porta, por assim dizer, através da qual, um grande número de crianças possa irromper para essa nova conjuntura. E quando isso ocorrer poderemos ter mudado nossa sociedade para sempre." Dr. Sugata Mitra

sábado, 1 de janeiro de 2011

O ano passou?

Revisitando o baú

Passou
O ano passou. Não sei se vós, leitor amigo, ou vós, distinta leitora, o passastes bem. Eu, como já passei muitos, os tenho passado de todo jeito, e ainda hoje esse segundo que vem depois da meia-noite me perturba.
Já passei ano só, em terra estranha, ou – o que é mais amargo – na minha; ou andando como um tonto na rua ou afundado num canto de bar ruidoso; ou tentando inutilmente telefonar; dormindo; com dor de dente. E quando digo de todo jeito estou dizendo também de jeito feliz, entre gente irmã ou nos braços de algum amor eterno – braços que depois dobraram a esquina do mês e da vida, e se foram, oh! provavelmente sem sequer a mais leve mágoa nos cotovelos, apenas indo para outros braços.
Passam os anos, passam os braços; mas fica sempre, quando a terra dá outra volta em si mesma, essa emoção confusa de um instante. Conheço pessoas que fogem a esse segundo de consciência cósmica, afetando indiferença, indo dormir cedo – como se não estivessem interessadas em saber se esta piorra velha deste planeta resolveu continuar girando ou não. É singular que entre tantas festas religiosas e cívicas nenhuma chegue a ser tão emocionante e perturbe tanto a humanidade como esta, que é a Festa do Tempo. É como se todos estivéssemos fazendo anos juntos; é o Aniversário da Terra.
Se a alma estremece diante do Destino, o espírito se confunde; reina uma tendência à filosofia barata; vejam como eu começo a escrever algumas palavras com maiúsculas, eu que levo o ano inteiro proseando em tom menor, e mesmo o nome de Deus só escrevo assim para não aborrecer os outros, ou para que eles não me aborreçam..
Já ao nome do diabo, não; a esse sempre dei, e dou, o 'd' pequeno, que outra coisa não merece a sua danação. A ele encomendamos o ano que passou - e a Deus, o Novo. Que vá com maiúscula também esse Novo; fica mais bonito, e levanta nosso moral.
E se entre meus leitores há alguma pessoa que na passagem do ano teve apenas um amargo encontro consigo mesmo, e viveu esse instante na solidão, na tristeza, na desesperança, no sofrimento, ou apenas no odioso tédio, que a esse alguém me seja permitido dizer: "Vinde. Vamos tocar janeiro, vamos por fevereiro e março e abril e maio, e tudo que vier; durante o ano a gente o esquece, e se esquece; é menos mal. E às vezes, ao dobrar uma semana ou quinzena, ás vezes dá uma aragem. Dá, sim; dá, e com sombra e água fresca. E quem vo-lo diz é quem já pegou muito sol nos desertos e muito mormaço nas charnecas da existência. Coragem, a Terra está rodando; vosso mal terá cura. E se não tiver, refleti que no fim todos passam e tudo passa; o fim é um grande sossego e um imenso perdão.
Rio, janeiro de 1952
Rubem Braga, A borboleta amarela