sexta-feira, 25 de março de 2011

Querem calar Ricardo Gama?

Quando lhes pisam os calos....
 Uns mandam calar com grito
Alguns usam a justiça
Outros tentam calar no tiro.
Regina Coeli Carvalho


*Ricardo Gama, advogado, tem um blog onde se tornou conhecido pelas críticas ao Governador e ao Prefeito do Rio de Janeiro e denúncias contra policiais.
Na última 4ª feira, numa praça movimentada em Copacabana, foi baleado com dois tiros na cabeça e um no ombro. Passou ontem por uma neurocirurgia e seu quadro é estável. Segundo as notícias veiculas pela Imprensa, Ricardo sofreu um atentado.
A ONG Repórteres Sem Fronteiras pediu apuração “urgente” do ataque sofrido pelo Ricardo.
Aguardamos pronunciamento de nossas autoridades.

Lembrando o Artigo XIX da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”

**Jorge Schweitzer, do Táxi em Movimento, está com o blog sob censura prévia, impedido de citar o nome daquele subsecretário de direitos humanos do Rio de Janeiro, tio do pai de Joanna Marcenal, que se encontra preso e responde pelos crimes de tortura, com dolo direto e homicídio qualificado por meio cruel.


Veja também:


segunda-feira, 21 de março de 2011

Diferente é ser normal...

Turma 1ª série - 1996

Hoje se comemora o Dia Internacional da Síndrome de Down, data escolhida fazendo alusão à trissomia do cromossomo 21. (21/3 ou 3-21)

Particularmente, não concordo que se possa comemorar algo, pois ainda existe muita discriminação em torno dos chamados diferentes.

Faço uso desse espaço para homenagear a Escola Soldadinho de Chumbo, localizada no Rio de Janeiro, que há muitos anos, antes de se falar em inclusão social, aceitava alunos portadores de necessidades especiais.

Quando minha filha entrou na idade escolar, embora fosse uma criança “normal”, comecei a pensar que escola eu queria para ela. Aquela que ensinasse "bem"? A que custasse menos? A que tivesse um ensino "forte"?
Muitos questionamentos... Muitas dúvidas. O que é a melhor escola?

Ao optar pela ESC, o fiz por saber que minha filha não seria mais um número no quantitativo, mas uma pessoa com seu universo particular respeitado. Como educadora, acredito que a escola deva caminhar junto com a família na formação do ser humano integral. Desenvolver a "essência" do homem é o grande desafio da educação.

Os meios de comunicação, o computador, a Internet etc.  são capazes de suprir as nossas crianças de muitas informações. Podem até, com vantagem, informar com mais rapidez e eficiência do que os "bons colégios". Mas o diferencial da boa escola está justamente na preocupação em formar essas pessoinhas como seres íntegros e dignos.

Minha filha aprendeu a caminhar junto com os diferentes, consciente de que a partilha de saberes e de solidariedade devem fazer parte do nosso cotidiano.

Meu carinho ao Tio Orlando, Tia Aída e Tia Carmem fundadores da Escola.
Meu carinho ao Silvio, Maria Alice, Jayme, Tia Marialba e todo o corpo docente e equipe que tão bem desenvolvem o papel de EDUCAR.

Publicado no Recanto das Letras em 21/03/2011
Código do texto: T2862783

terça-feira, 15 de março de 2011

Terapêutica do Grito




"Temos, há muito tempo, guardado dentro de nós um silêncio bastante parecido com estupidez". Eduardo Galeano

Vamos gritar!!!!

sábado, 12 de março de 2011

Nova terapia...

Fui à Feira de Antiguidades na Rua do Lavradio, RJ, e encontrei numa barraca de artesanato esse porta alfinetes.
Queria comprar dois para presentear umas amigas queridas, mas a artesã me disse que já havia vendido todos, tendo sobrado somente um.
Vou enviar esse mimo para Lis, mas deixo a sugestão como um novo processo terapêutico.
Quando quisermos descarregar nossa indignação contra as maracutaias políticas é só usar muitos alfinetes no político imortal, que representa a “nata” da política brasileira.
Mãos à obra!

quinta-feira, 10 de março de 2011

Na boca do povo

Imagem de autoria desconhecida


Está circulando pela internet um texto com o título “no frigir dos ovos” com autoria trocada e alguns enxertos no final.
Antes que o atribuam a Dona Benta, eis o texto na íntegra, seu autor e a fonte de pesquisa.

Na boca do povo
As expressões populares que colocam a comida na "ponta da língua" dos brasileiros

Quando comecei com essa coluna, pensava que escrever sobre comida seria sopa no mel, mamão com açúcar. Só que depois de um certo tempo dá crepe, você percebe que comeu gato por lebre e acaba ficando com uma batata quente nas mãos. Como rapadura é doce mas não é mole, nem sempre você tem idéias e pra descascar esse abacaxi só metendo a mão na massa. E não adianta chorar as pitangas ou, simplesmente, mandar tudo as favas.

Já que é pelo estômago que se conquista o leitor, o negócio é ir comendo o mingau pelas beiradas, cozinhando em banho-maria, porque é de grão em grão que a galinha enche o papo.

Contudo é preciso tomar cuidado para não azedar, passar do ponto, encher lingüiça demais. Além disso, deve-se ter consciência de que é necessário comer o pão que o diabo amassou para vender o seu peixe. Afinal não se faz uma boa omelete sem antes quebrar os ovos.

A quem pense que escrever é como tirar doce da boca de criança e vai com muita sede ao pote. Mas como o apressado come cru, essa gente acaba falando muita abobrinha, são escritores de meia tigela, trocam alhos por bugalhos e confundem Carolina de Sá Leitão com caçarolinha de assar leitão.

Há também aqueles que são arroz de festa, com a faca e o queijo nas mãos, eles se perdem em devaneios (piram na batatinha, viajam na maionese...etc.). Achando que beleza não põe mesa, pisam no tomate, enfiam o pé na jaca, e no fim quem paga o pato é o leitor que sai com cara de quem comeu e não gostou.

O importante é não cuspir no prato em que se come, pois quem lê não é tudo farinha do mesmo saco. Diversificar é a melhor receita para engrossar o caldo e oferecer um texto de se comer com os olhos, literalmente.

Por outro lado se você tiver os olhos maiores que a barriga o negócio desanda e vira um verdadeiro angu de caroço. Aí, não adianta chorar sobre o leite derramado porque ninguém vai colocar uma azeitona na sua empadinha não. O pepino é só seu, e o máximo que você vai ganhar é uma banana, afinal pimenta nos olhos dos outros é refresco.

A carne é fraca, eu sei. Às vezes dá vontade de largar tudo e ir plantar batatas. Mas quem não arrisca não petisca, e depois quando se junta a fome com a vontade de comer as coisas mudam da água pro vinho.

Se embananar, de vez em quando, é normal, o importante é não desistir mesmo quando o caldo entornar. Puxe a brasa pra sua sardinha que no frigir dos ovos a conversa chega na cozinha e fica de se comer rezando. Daí, com água na boca, é só saborear, porque o que não mata engorda.

Acompanhamentos

Como vimos, além de rica em cores e sabores a culinária brasileira também oferece ótimos eufemismos e deliciosas metáforas. Desempenhando uma função social que vai muito além da nutrição, a comida, no Brasil, está relacionada a diversas manifestações da cultura popular, entre elas a linguagem.

Dessa interação nasceram várias expressões famosas e corriqueiras, verdadeiras "pérolas" do colóquio nacional. Saber a origem de algumas delas pode ser tão prazeroso quanto provar um bom prato. O difícil é conseguir provar a tal origem, pois quando se trata de expressões populares cada um tem sua própria versão.

As descritas abaixo são as minhas versões, às vezes, inspiradas na de outros, já que andei pesquisando um pouco. Não acredite em tudo. Mas, por mais estapafúrdias que pareçam, certas origens podem muito bem ser verdadeiras.

- A carne é fraca – Essa expressão retirada da bíblia representa a dificuldade de se resistir a certas tentações. A gula (pecado ou não) está sempre nos mostrando isso, porque a carne pode até ser fraca, mas grelhadinha no molho de mostarda...hum! Fica divina. "Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca". (Mt. 26:41)

- Apressado come cru – Como o microondas e o fast food são invenções recentes, até certo tempo atrás era preciso esperar um pouco mais para a comida ficar pronta, ou então comê-la crua. Nessa época a culinária japonesa ainda não estava na moda, logo comida crua era vista com maus olhos, e a expressão passou a ser usada para significar afobamento, precipitação...etc.

- Arroz de festa – Assim são chamadas aquelas pessoas que não perdem uma festa por nada, tendo ou não sido convidadas pra mesma. A origem dessa expressão talvez advenha do costume de se jogar arroz em recém casados. Mas o mais provável é que ela tenha surgido devido a uma antiga tradição portuguesa. Nas festas e comemorações das tradicionais famílias portuguesas nunca faltava uma sobremesa feita com arroz, leite, açúcar e algumas especiarias (arroz doce) e que era conhecida, na época, como "arroz de festa".

- Chorar as pitangas – Pitangas são deliciosas frutinhas vermelhas cultivadas e apreciadas em todo o país, principalmente nas regiões norte e nordeste. A palavra pitanga deriva de pyrang, que em tupi guarani significa vermelho. Sendo assim a provável relação da fruta com o pranto vem do fato de os olhos ficarem vermelhos, parecendo duas pitangas, quando se chora muito.

- Comer o pão que o diabo amassou – Significa passar por uma situação difícil, um sofrimento. Imagino que a origem dessa expressão venha do fato de que deve ser, realmente, indigesto engolir um pão amassado (amassar é o mesmo que fazer a massa) pelo capeta. Além da procedência, nada confiável, do produto (se vem do coisa ruim, boa coisa não pode ser) tem grandes chances desse pão vir queimado, já que foi assado no fogo do inferno.

- Dar uma banana – É das poucas expressões que são acompanhadas por um gesto. Aliás, neste caso, o mais provável é que o gesto tenha inspirado a expressão, já que ele existe em vários países como Portugal, Espanha, Itália e Brasil. Em todos esses lugares o gesto significa a mesma coisa: um desabafo ou uma ofensa. Já a alusão à banana é exclusividade tupiniquim e fica por conta da criatividade, tão peculiar ao brasileiro.

- Farinha do mesmo saco - "Homines sunt ejusdem farinae" esta frase em latim (homens da mesma farinha) é a origem dessa expressão, utilizada para generalizar um comportamento reprovável. Como a farinha boa é posta em sacos diferentes da farinha ruim, faz-se essa comparação para insinuar que os bons andam com os bons enquanto os maus preferem os maus.

- Pagar o pato – A expressão deriva de um antigo jogo praticado em Portugal. Amarrava-se um pato a um poste e o jogador (em um cavalo) deveria passar rapidamente e arrancá-lo de uma só vez do poste. Quem perdia era que pagava pelo animal sacrificado, sendo assim passou-se a empregar a expressão para representar situações onde se paga por algo sem obter um benefício em troca.

- Ser de meia tigela – Na época da monarquia portuguesa muitos jovens habitavam os castelos, eles prestavam serviços domésticos à corte e recebiam alimentação e moradia por isso. Entre estes jovens, haviam vários vindos do interior, que pela pouca experiência e origem humilde, eram desprezados pelos veteranos, sendo ironicamente tratados por "fidalgos de meia tigela", já que embora habitassem o palácio não participavam de rituais importantes da corte. Como em alguns desses ritos quebravam-se tigelas, dizia-se que eles eram de meia tigela porque nunca quebrariam a tigela, privilégio reservado aos nobres.

Bom, essas são algumas das histórias mais interessantes, mas se você se interessou pelo assunto e quer continuar a desvendar a origem das expressões, pode recorrer a sua própria criatividade, a sua avó e as amigas dela do jogo de biriba ou então aos seguintes livros:

- De onde vêm as palavras, Deonísio da Silva (Editora A Girafa, 2004). - Neste livro se encontram milhares de verbetes explicando a origem etimológica de várias palavras e expressões. Mais do que desvendar a origem, Deonísio explica, em alguns casos, a história das palavras e como elas se modificaram desde o seu surgimento.

- Mas será o Benedito?, Mario Prata (Editora Globo, 1996) - Várias histórias criadas pelo autor para explicar a origem de algumas expressões populares faladas por nós estão presentes neste livro. Privilegiando mais o humor que o rigor científico, Mario Prata assume que inventou a maioria dos verbetes sem se preocupar com a verdade histórica. O livro também pode ser encontrado na Internet, no site do autor está disponível uma versão integral do texto, o endereço é: www.marioprataonline.com.br

Claudemir Beneli - Gastronomia e Culinária
http://www.bonde.com.br/?id_bonde=1-14--1688-20050520&tit=na+boca+do+povo




terça-feira, 8 de março de 2011

Dia Internacional da Mulher?



Haverá o dia que não precisaremos ter um dia para comemorar, como nos mostra o filme, que seja o Dia Internacional da Pessoa.

segunda-feira, 7 de março de 2011

A Janela Fechada de Dona Elizabeth

Quem acompanha o bloco Gigantes da Lira espera o momento especial quando diante de um sobrado a orquestra para e toca Carinhoso em homenagem a Dona Elizabeth. Senhora octagenária que chegava a janela e emocionada acenava para os foliões.

Foto Anna Clara Carvalho - Gigantes da Lira 2010

Esse ano a janela estava fechada, a homenagem foi feita da mesma maneira, mas a emoção dos foliões misturou-se a dúvida, o que aconteceu com Dona Elizabeth. Embora muitos tenham ficados surpresos não se ouviu perguntas.
Em mim as lágrimas rolaram. Clara que estava em outro ponto fotografou e depois comentou que também chorou naquele momento.

Foto Anna Clara Carvalho - Gigantes da Lira 2011
 
Creio que não surgiram comentários talvez para que a explicação da sua ausência não doesse mais.
Imagino que ela não esteja mais entre nós, mas naquele momento senti sua presença como se estivesse pelas frestas das venezianas escondida ouvindo a melodia que é um hino a sua existência.

sábado, 5 de março de 2011

O Menino que Fazia Versos


 O Menino que fazia versos
De que vale ter voz?
Se só quando não falo é que me entendem?
De que vale acordar?
Se o que vivo é menos do que o que sonhei?

(Versos do menino que fazia versos)

- Ele escreve versos!
Apontou o filho, como se entregasse criminoso na esquadra. O médico levantou os olhos, por cima das lentes, com o esforço de alpinista em topo de montanha.
- Há antecedentes na família ?
- Desculpe, doutor ?
O médico destrocou-se por tintins, Dona Serafina respondeu que não. O pai da criança, mecânico de nascença e preguiçoso por destino, nunca espreitara uma página. Lia motores, interpretava chaparias. Tratava-a bem, nunca lhe batera mas a doçura mais requintada que conseguira tinha sido em noite de núpcias:
- Serafina, você hoje cheira a óleo Castrol.
Ela hoje até se comove com a comparação. Sim, perfume de igual qualidade qual outra mulher pode sequer sonhar ? Pobres que fossem os dias, para ela, tinham sido lua-de-mel. Para ele, período de rodagem. O filho fora confeccionado nesses namoros de unha suja, restos de combustível manchando o lençol. E oleosas confissões de amor.
Tudo corria sem mais, a oficina mal dava para o pão e a escola do miúdo. Mas eis que começam a aparecer, pelos recantos da casa, papeis rabiscados com versos. O filho confessou, sem pestanejo, a autoria do feito.
- São meus versos, sim.
O pai logo sentenciara: havia que tirar o miúdo da escola. Aquilo era coisa de estudos a mais, perigosos contágios, más companhias. Pois o rapaz, em vez de se lançar no esfrega-refrega com as meninas se acabrunhava nas penumbras e, pior ainda, escrevia versos. O que se passava: mariquice intelectual ? Ou carburador entupido, avarias dessas que a vida do homem se queda em ponto morto ?
Dona Serafina defendeu o filho e os estudos. O pai, conformado, exigiu: então, ele que fosse examinado.
- O médico que faça revisão geral, parte mecânica, parte eléctrica.
Queria tudo. Que se afinasse o sangue, calibrasse os pulmões, e sobretudo lhe espreitassem o nível do óleo na figadeira. Houvesse que pagar por sobressalentes, não importava. O que urgia era por cobro àquela vergonha familiar.
Olhos baixos, o médico escutou tudo, sem deixar de escrevinhar num papel. Aviava já a receita para poupança de tempo. Com enfado, o clínico se dirigiu ao menino:
- Dói-te alguma coisa ?
- Dói-me a vida, doutor.
O doutor suspendeu a escrita. A resposta, sem dúvida, o surpreendera. Já Dona Serafina aproveitava o momento: está a ver, doutor ? Está ver ? O médico voltou a erguer o olhos e a enfrentar o miúdo:
- E o que fazes quando te assaltam essas dores ?
- O que melhor sei fazer, excelência, é sonhar.
Serafina voltou à carga e sapateou a nuca do filho. Não lembrava o que pai lhe dissera sobre os sonhos ? Que fosse sonhar longe ! Mas o filho reagiu: longe, porquê ? Perto, o sonho aleijaria alguém ? O pai teria, sim, receio de sonho. E riu-se, acarinhando o braço da mãe.
O médico estranhou o riso. Custava a crer, visto a idade. Mas o moço, voz tímida, foi-se anunciando. Que ele, modéstia apartada, já inventara sonhos desses que já nem há, só no antigamente, coisa de bradar à terra. Exemplificaria, para melhor crença. Mas nem chegou a começar. O doutor o interrompeu:
- Não tenho tempo, moço, isto aqui não é nenhuma clínica psiquiátrica.
A mãe, em desespero, pediu clemência. O doutor que desse ao menos uma vista de olhos pelo caderninho dos versos. A ver se ali catava o motivo de tão grave distúrbio. Contrafeito, o médico aceitou e guardou o manuscrito na gaveta. A mãe que viesse na próxima semana. E trouxesse o paciente.
Na semana seguinte foram os últimos a serem atendidos. O médico, sisudo, taciturneou: o miúdo não teria, por acaso, mais versos ? O menino não entendeu.
- Não continuas a escrever ?
- Isto que faço não é escrever, doutor. Estou, sim, a viver. Tenho esse pedaço de vida - disse, apontando um novo caderninho - quase a meio.
O médico chamou a mãe, à parte. Que aquilo era mais grave do que se poderia pensar. O menino carecia de internamento urgente.
- Não temos dinheiro, fungou a mãe entre soluços.
- Não importa, respondeu o doutor.
Que ele mesmo assumiria as despesas. E que seria ali mesmo, na sua clínica que o menino seria sujeito a devido tratamento.
Hoje quem visita o consultório raramente encontra o médico. Manhãs e tardes ele se senta num recanto do quarto de internamento do menino. Quem passa pode escutar a voz pausada do filho do mecânico que vai lendo, verso a verso, o seu próprio coração.
Mia Couto, In O Fio das Missangas

quinta-feira, 3 de março de 2011

Para Cris

Foto minha


Cris,
Um dia conversava com minha filha, bem pequenina, sobre solidariedade.
A solidariedade não se ensina em livros, se ensina em comportamentos, mas mesmo assim li para ela uma historinha que transcrevo abaixo:

AJUDANDO A CHORAR
A menina chegou em casa atrasada para o jantar.
Sua mãe tentava acalmar o nervoso pai enquanto pedia explicações sobre o que havia acontecido.
A menina respondeu que tinha parado para ajudar Janie, sua amiga, porque ela tinha levado um tombo e sua bicicleta tinha se quebrado.
- "E desde quando você sabe consertar bicicletas?" Perguntou a mãe.
- "Eu não sei consertar bicicletas!" Disse a menina.
- "Eu só parei para ajudá-la a chorar".
Não muitos de nós sabemos consertar bicicletas.
E quando nossos amigos caíram e quebraram, não as suas bicicletas mas suas vidas, poucas vezes tivemos capacidade para conserta-la.
Não podemos simplesmente consertar a vida de outra pessoa, embora isso seja o que nós gostaríamos de fazer.
Mas como a menina, nós podemos parar para lhes ajudar a chorar.
Se isso é o melhor que nós podemos fazer...
E isso é muito!
Texto de Murray Lancaster, tradução de Sergio Barros.

Eu não sei consertar bicicletas nem tão pouco aprendi a andar, meu pai nunca pode me dar uma, mas me deixou valores e um deles é o da solidariedade.
Meu abraço carinhoso,
Regina Coeli Carvalho

quarta-feira, 2 de março de 2011

Eu também busco....


BUSCA


Tenho encontrado muitas pessoas,
porém não encontro gente....

Há um vazio dentro de cada um,
um processo de fechamento em sentimentos.

Encontro sorrisos, porém daqueles
que expõem apenas os dentes, mas não a alma.

Encontro verdadeiras tocaias, e não corações.
Reservas insistentes da solidão.

Tenho encontrado pessoas medrosas,
indecisas, escondendo-se de si mesmas.

Pessoas que dizem: Não sei...,
Não sei se quero..., Não sei se posso...

Quando sabem exatamente
o que querem e o que buscam,
e não se arriscam ao menor impulso.

Pessoas duras, escuras,
impossibilitadas de amar.
Estas, cansei de encontrar...

Busco por gente que empreste o ombro,
que não tenha medo de dizer que levou um tombo.

Busco por gente que assuma que amar traz sofrer,
e, com esta certeza, não venham a se esconder.

Busco por gente que tenha a experiência
de sobrevivente de guerra.

Busco por gente, que de tanto caminhar,
não tenha receio de dizer
que seus pés ainda têm muito por machucar.

Quero gente de coragem para comigo conversar.

Gente que saiba que máscaras
não dão mais para usar,
e sendo seu perfil interno, branco ou preto,
tenha a dignidade de revelar.

Busco por gente que chore livremente,
sem preconceitos pelas lágrimas derramadas.

Quero gente que saiba exatamente
para onde está indo e o que deseja encontrar,
mesmo que esta busca jamais venha alcançar.

Busco por gente,"Seres Humanos",
que saibam se doar,
estes, eu anseio por encontrar
Gente que saiba até ferir se precisar,
mas que seja valente em seu ato
para não mais enganar,
a quem quer que seja, e a si próprio.

Gente de decisão,
sem argumento para esconder,
escusas ações.

Quero gente que é gente,
que mostra a cara,
vai à luta e dorme contente.

É desta gente que eu preciso!

Gente liberta,
que me dêem um canto em seu colo
e saibam me acariciar,
sem tempo, sem hora
e em qualquer lugar. 

Cora Maria

terça-feira, 1 de março de 2011

Feliz aniversário, Cidade Maravilhosa

 Foto: Anna Clara Carvalho

Louvação a Cidade do Rio de Janeiro

Louvo o Padre, louvo o Filho
E louvo o Espírito Santo.
Louvado Deus, louvo o santo
De quem este Rio é filho. 

Louvo o santo padroeiro
- Bravo São Sebastião -
Que num dia de janeiro
Lhe deu santa defensão. 

Louvo a Cidade nascida
No morro Cara de Cão.
Logo depois transferida
Para o Castelo, e de então
Descendo as faldas do outeiro,
Avultando em arredores,
Subindo a morros maiores
Grande Rio de Janeiro!

Rio de Janeiro, agora
De quatrocentos janeiros...
Ó Rio de meus primeiros
Sonhos! (A última hora
De minha vida oxalá
Venha sob teus céus serenos,
Porque assim sentirei menos
O meu despejo de cá.)

Cidade de sol e bruma,
Se não és mais capital
Desta nação, não faz mal:
Jamais capital nenhuma,
Rio, empanará teu brilho,
Igualará teu encanto.
Louvo o Padre, louvo o Filho
E louvo o Espírito Santo.

Manuel Bandeira