quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Mulheres com bolsas


Somos todas mulheres com bolsas

Ou estamos ficando assim.

nada dura

nem o amor

nem o amado

nem a esperança.

Até as montanhas

desmoronam

só o oceano espera

pelo nosso pranto.

Bolsas de memórias

contam-nos quem fomos

antes de sermos sábias.

As bolsas nos pesam.

Carregando aonde vamos

nossas perdas, tropeçamos

agarradas a essa não- liberdade

que protegemos de todas as ameaças

ou promessas

pois são tudo o que temos

pois são tudo o que sabemos

pois são tudo o que somos.

Ruth Harriet Jacobs, in “Quando envelhecer vou usar PÚRPURA” ,organização de Sandra Haldeman Martz , tradução de Lya Luft




* Há muito tempo procuro esse livro, encontrei-o há pouco em um sebo. Vou começar a treinar pois eu também vou usar púrpura.

Regina


Há algum tempo recebi do meu amigo Max essa foto e o poema “Regina” com a recomendação que postasse no blog. Coloquei a foto, mas o poema fui deixando para depois.

Hoje levei um puxão de orelhas, de leve, por ainda não ter postado a poesia.

Ei-la:

REGINA

Tu dás e tiras a poesia ao mesmo tempo.
eu tenho olhos para não te ver - tenho braços para não te apertar - tenho voz para não te falar - tenho ouvidos para não te ouvir.

Eu ando de templo em templo - de coração em coração - de poema em poema - de filme em filme - de bordel em bordel - procurando com lúcido fervor te desenvolver em todas as coisas.

Nasceste poderosamente dentro de mim - e de agora em diante és a revelação que estabeleço entre todas as coisas.

Não és mais uma determinada mulher - és diversas mulheres que emergiram do caos, aos pedaços, cobertas de esparadrapos - e que eu suturei e liguei numa só e única - a universal mulher sem idade, sem raça e sem temperamento.

E és também - quem sabe - a anti-mulher, a que se nega sempre, desde o princípio dos tempos, ao poeta, para que ele possa desejá-la eternamente - e nunca desmanche o ideal.

Murilo Mendes


Laranjeiras...

Hoje pela manhã minha amiga Damaris deixou-me um recado:

“Bom dia, amiga querida...
Estava pensando, o nome do bairro em que vc mora é lindo, né?
Beijo...estou saindo pro trabalho...”

Lembrei-me, então, desta crônica linda, escrita pelo ONDJAKI, escritor angolano e morador do bairro.

A foto abaixo é do ensaio do bloco “Volta, Alice” tirada da minha janela no domingo, 25 de janeiro.



Laranjeiras de mim...


...talvez as pessoas gostem de lembrar e celebrar a cidade do Rio de Janeiro com as praias e as copacabanas e as ipanemas e as mulatas e as cervejas num futebol de Maracanã enlouquecido pela multidão, passando pelos carnavais e as favelas, tudo bem, pode ser, para mim, a cidade do Rio é e vai sendo o pacato bairro das Laranjeiras, com as árvores bonitas de poemas silenciosos e o cocô dos cães nos passeios,
em Luanda quando pisamos em cocô de cão dizemos "ativei uma mina", e o meu olhar está sempre em permanente alerta, é raro eu ativar uma dessas incômodas minas, Laranjeiras é o lugar da minha calma e da minha quase distância de mim, aqui conheci antigos amigos que me faltava colecionar, o mundo mágico e palavroso do meu amigo Lino (dono de uma infância fabulosa com laivos concretos de realidade), aqui sei das vozes das crianças ao fim da tarde e o silêncio bonito, mudo, dos miúdos que saem alegres da escola de surdos, muitas vezes aprecio, em Laranjeiras, o intervalo dos meninos na escola para surdos, quanta alegria silenciosa!, quanta beleza nos gestos que inventam dizer sorrisos,
mais adiante, a Rua Alice, a comida agradável na Adega do Serafim, alguns metros depois, é raro não estar lá o Edgar na sua tasca, ou está de pé junto ao balcão ou fica mais ao fundo, como que saboreando a tarde, talvez pensando na vastidão do tempo que já atravessou, ali perto gritam os taxistas, buzinam, passam velozes os entregadores nas suas bicicletas gordas de rápida frequência, o hospital das pessoas com problemas de coração, e também crianças - ali dentro se joga o futuro dos corpos e o destino das vidas, o coração, órgão que afinal cataliza a vida, ou a interrompe, frágil no seu tamanho e responsável dizem - por emoções associadas à poesia, à coragem, às decisões, aos rumos,
ao fim da tarde, no início da General Glicério, um senhor de idade avançadíssima abre as janelas como quem fosse voar ou convidar pássaros para a sua tarde, deixa que a sua música clássica invada a rua e contagie os passantes, sorrio para ele, ao que ele me corresponde com uma mirada que é misto de loucura e vôo, se ele não faz adeus com a mão, faz com o olhar,
ali existe um ruído de árvores, ao fim da tarde, que Luandino Vieira, escritor angolano, chama de "xaxualhar" (um belo termo, penso), o maximbombo (ônibus) 184 vai levar o seu condutor à Central, ele que queria ficar ali a conversar com os outros, a beber o seu café,
mais longe os bicheiros fazem o seu trabalho com maior ou menor simpatia, gatafunham rabiscos, poderosos códigos, permanecem atentos aos celulares, passa um homem gordo com um cinto frágil na cintura, todas as tardes aposta (terá ganho?, continua a ganhar?), o arrumador de carros sorri mesmo quando não lhe dão a prometida moeda, do supermercado saem as empregadas com as compras, as velhotas de roupa mal escolhida e de varizes desprotegidas, as babás escuras com os meninos claros,
dentro do supermercado sou invadido pela timidez do meu sotaque, procuro os artigos antes de ter que fazer perguntas em voz alta, se as faço obrigam-me a falar mais alto e as pessoas olham para mim, "você é português?", eu só queria encontrar uma caixa com seis ovos em vez de 24, "sou angolano", digo, mas as caixas com seis ovos são raras, o alho francês aqui tem outro nome, o sal grosso é demasiado grosso, as stella artois são baratas, o vinho português é caro, o sabão líquido de lavar a louça é demasiado diluído, mas ali onde a General Glicério encontra a Rua das Laranjeiras, no cantinho, está o Nossa Sorveteria e Confeitaria, com a simpatia do senhor Adriano (e as respectivas filhas),
lá o suco de melancia misturado com melão é uma maravilha, ou então uma cerveja bem gelada, porque junto das cinco, infalivelmente, a bela criatura - senhor Barone? - a quem chamam de Vovô vai chegar, na sua inclinação cronológica, vai sorrir, cumprimentar e beber religiosamente o seu copo de cerveja, enquanto ninguém mais fala, só o arvoredo, como que inventando segredos longínquos, no que o Luandino diz ser o "xaxualhar" das árvores, aqui, na cidade do Rio de Janeiro, no quieto bairro das Laranjeiras, perto de um dos terraços mais simpáticos do mundo...

ONDJAKI - escritor angolano (publicado na Revista O Globo, 14/09/08)

domingo, 25 de janeiro de 2009

Maria Rezende....

Do arquivo 2

você me deu a palavra tosco
eu te dei a palavra atarantada

você me deu tom zé
eu te dei o galeano

você me trouxe mais loucura
eu te mostrei praticidades

você me faz bater palmas
eu te faço saltitar pela casa

você é letra e música
eu sou só palavra

eu te alimento
você me come

a gente junto inventa o mundo
e se diverte
e anda por aí

a gente junto é melhor que sozinho
ainda é cada um mas cada um ganha mais brilho

adoro esse encontro
adoro a permanência
o desenho dos dias com você

adoro conviver
com você, viver

Maria Rezende, http://mariadapoesia.blogspot.com/

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Aos visitantes.....

"Boa Terra em teus pés, Água o bastante em tua semente, bom Vento para o teu sopro, Fogo em teu coração e muito Amor em teu ser." (J.Y.Leloup )

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Cotidiano.....


Foto Luís Barra

Febem street

São tantos menores

Abandonados pelas calçadas

De Paulisibéria

Que um dia os maiores

Acabam tropeçando neles

E param de fingir

Que ainda não notaram

Ulisses Tavares


terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Clara, Francisco e o reencanto da vida!

Reencantar a vida

A espiritualidade franciscana é uma espiritualidade de encanto, de admiração, de apaixonamento, de sensibilidade, de percepção. São características que vão determinando essa espiritualidade tão fontal (que dá origem), tão rica, que há oitocentos anos reúne uma família que respira o mesmo espírito.


Francisco, mais do que um personagem medieval, mais do que um santo cristão e católico, mais do que filho de Pietro Bernardone, é um momento dentro de nós. Ele é a expressão cristalina de todas as virtudes que nós sonhamos. Por isso, dizemos reencantamento.


O mundo precisa de Francisco. Precisa de Francisco porque ele mostrou para nós que é possível estar na vida sem passar desatento por ela; que é possível estar no reencantamento de todas as criaturas e de todas as pessoas.

Francisco é a presença da louvação, do êxtase, da gratidão, da gratuidade. Tem os olhos abertos para ver que, se existe esse mundo de criaturas, é preciso haver o Cântico das Criaturas. E por isso criou uma espiritualidade fontal, próxima, caseira.


A espiritualidade de Francisco é como um pão caseiro: nós colocamos a mão na massa e vamos moldando e trabalhando até encontrar o sabor que tem de ser saboreado. Ela não é uma coisa complicada. É alegria de estar juntos, o prazer de se conviver, de se encontrar, de se relacionar.


Se existe algo característico na espiritualidade franciscana é que ela une espírito e afeto. Para ela, espiritualidade e afetividade não se separam. Por isso, Francisco revoluciona a sociedade e a eclesialidade da época. Religiões, muitas vezes, têm o discurso do sagrado e do eterno, mas negam aquilo que o humano tem de mais sagrado e eterno, que é o seu afeto.


Muitas religiões passaram séculos dizendo não. Religião que diz "não" com muita frequência, não pode ser coisa boa. A espiritualidade de Francisco entra na religiosidade dizendo um sim à vida, trazendo o canto da louvação: "louvado sejas meu Senhor por todas as tuas criaturas. Altíssimo, Onipotente Bom Senhor".

É preciso ver e admirar a bondade presente em todas as coisas. A vertente da bondade, do acolhimento, da simpatia, da alegria, mostra a dignidade e a beleza do humano e de todas as coisas.


Francisco não é complicado. Nós, pós-modernos e filhos e filhas da modernidade, é que complicamos mais a vida, porque nós passamos de um modo desapercebido por todas as experiências. Nós vamos perdendo o fervor da experiência, o fervor das palavras, a alegria de estar juntos e, às vezes, não percebemos as coisas.


Por exemplo, se Francisco estivesse aqui, ele já nos teria apresentado um irmão, um irmão muito querido. Está aqui: o ARLINDO. Alguém viu o Arlindo? O ar lindo entrou pela janela. Nós enchemos os pulmões e pudemos dizer: "como é bom respirar o ar desse lugar. Louvado sejas meu Senhor pelo ar lindo!"

Se Francisco estivesse aqui, ele teria feito, no silêncio do coração, uma prece assim: "Louvado sejas meu senhor pela cadeira, meio apertadinha, anatomicamente não muito assim boa, mas muito obrigado porque ela presta uma bondade, um serviço imenso para o meu corpo". Quem de nós agradeceu a cadeira hoje? (todo mundo diz não) Nem eu.


E a irmã água? Que de manhã nos encontramos com ela na torneira, no chuveiro, lavamos o rosto, o corpo, as remelas dos olhos, escovamos os dentes. Quem de nós lembrou de agradecer pela água, tão pura, levinha, aqui no poço, bem ao lado desta sala?


Então, a espiritualidade de Francisco é a espiritualidade da convivência, do relacionamento. É não passar de um modo distraído pela vida. Então, isso é reencantar a vida, porque reencantar significa estar junto.

Vitório Mazzuco Filho



Clara




Clara

Clara é uma bebê de 01 ano e quatro meses de idade. Ela tem Paralisia Cerebral. Ela não usa suas mãos muito bem, não consegue sentar, não engatinha, tem algumas dificuldades para comer, beber, etc.

A esperança de Clara é um Tratamento com Células Tronco. Isso pode curá-la. Vamos colaborar com o tratamento da Clara?

Aqui você irá encontrar todas as informações sobre a Clarinha, tratamentos e formas de colaboração.

“A solidariedade é a forma visível do amor. Pela magia do sentimento de solidariedade o meu corpo passa a ser morada do outro. É assim que acontece a bondade.” Rubem Alves

sábado, 17 de janeiro de 2009

Poesia do dia......

Meus gatos deixam marcas pelas paredes
ao entrarem pelas janelas,
na madrugada.
Homens me deixaram marcas de lágrimas no rosto,
ao saírem na madrugada.
Ambas marcas facilmente removíveis
com água limpa.

As marcas na alma?
Estas removo-as com poesia.

Ivy Wyler



quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Reflexão

Menino segura seu ursinho em meio a destroços em Gaza

"Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor da pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender; e, se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar.” Nelson Mandela

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Para Clarinha, na véspera do seu aniversário!

Kits escolares, a visita e o agradecimento


Na semana passada enviei por e-mail para alguns amigos o texto abaixo:

Cleyde Prado Maia – Do luto à luta

Cleyde era mãe da Gabriela, que faleceu aos 14 anos vítima de uma bala perdida no Metrô do Rio de Janeiro.

Após a morte de sua única filha em uma entrevista ela declarou:

“Em vez de entregar os pontos, eu pus minha dor num saco e transformei em luta meu sofrimento."

Essa postura chamou minha atenção e decidi conhecer essa mulher guerreira. Ficamos amigas e constantemente colaborava com suas campanhas. A última que estivemos juntas foi no início do ano de 2008, na Campanha do Kit Escolar, material esse distribuído em comunidades carentes.

Minha amiga Cleyde, faleceu em 05 de setembro do ano passado, vítima de um AVC e foi enterrada no dia do meu aniversário. Imaginem minha tristeza.

Seus amigos, colaboradores antigos das passeatas, campanhas, luta contra impunidade resolveram dar continuidade ao trabalho tão bem coordenado por ela.

Cleyde Prado Maia – Do luto à luta , comunidade no Orkut que abraçou a campanha do kit escolar

http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=128382

Caso você queira participar os itens que compõem os kits são:

Kit Escolar:
1 caderno grande
1 caderno pequeno
3 lápis pretos
2 canetas azuis
1 caneta vermelha
1 apontador
1 borracha
1 caixa de lápis de cor

Maiores informações no tópico: Primeira Campanha: Material escolar

http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs.aspx?cmm=128382&tid=5286607994183116216&start=1

Lembrando sempre: “O trabalho voluntário não alegra apenas quem o recebe, mas é fonte de ternura e crescimento também para quem o oferece.”

Abraços a todos.

Meus amigos queridos contribuíram e consegui montar 70 kits para serem entregues ao pessoal da comunidade Cleyde Prado Maia – Do luto à luta e serem distribuídos nas comunidades carentes.



Ao terminar de montar os kits com o sentimento de dever cumprido eis que recebo uma visita cantarolante na minha sala, uma simpática cigarra. Cantou bastante e embora tenhamos pousado-a cuidadosamente no peitoril da janela para que voltasse para à rua ela retornou e instalou-se no teto cantando cada vez mais.

Sei não, acho que essa cigarra foi um sinal da Cleyde. Um sinal de amor!

Fica em paz, amiga!



Meu agradecimento aos amigos “beija-flor” que cada qual com a sua gotinha ajudam a apagar o “incêndio na floresta”.

Abraço carinhoso a todos.

Regina Coeli Carvalho