sábado, 27 de agosto de 2011

Cleyde Prado Maia


Amiga,
Onde quer que você esteja receba minha saudade.

À Doutora dos Afetos

 Imagem daqui:

Hoje, dia do psicólogo, deixo minha eterna gratidão a Dra. Nise da Silveira, psiquiatra que olhava o ser humano antes de enxergar a doença.
Através de meu pequeno contato como estagiária, de sua obra, da leitura e releitura constante de suas lições de vida cresci como pessoa e profissional.
Compartilho com vocês uma das passagens de sua vida narradas no livro Nise: arqueóloga dos mares por Bernardo Carneiro Horta.

Aos 90 anos, foi coroada com cocar de cacique. Um xavante convidou-a para ser sua mãe

Idosa, Nise se comovia cada vez mais com suas histórias - não somente as antigas, mas também as daquela ocasião.

"Ontem, me aconteceu uma coisa: dois índios vieram me visitar. Fato curioso... Nós conversamos, almoçamos e tudo foi muito agradável. No dia seguinte, um deles foi embora. Mas, para minha surpresa, o outro retornou e me disse: 'Sonhei com minha avó e ela pediu para que eu voltasse aqui e convidasse a senhora para ser mãe xavante - minha mãe...' Nem é preciso dizer que fiquei impressionadíssima com tal convite!", contou a Dra.

Este índio se chama José Luís Tsereté. É cacique xavante e foi apresentado à Nise pela antropóloga May Waddington, amiga e participante do Grupo de Estudos C.G.Jung. O fato emocionou a psiquiatra, pois aquele índio de 45 anos de idade tocara num ponto especial: a maternidade. A Dra. não teve filhos... Como se não bastasse, o convite, por sincronicidade, lhe chegou no dia das mães. Então, o xavante já adulto, perante a anciã, perguntou em tom oficial: "A senhora aceita ser minha mãe?" Ela se comoveu. Aos noventa anos, era a primeira vez que alguém a chamava, tão diretamente, de mãe.

De pé, vestido de calças jeans, camiseta e cocar, José Luís esperava atentamente pela resposta. A mulher lhe disse: "Sim. Eu aceito. Mas quero saber quais são as obrigações de uma mãe xavante." Ele revelou: "Estar ao lado de uma pessoa que sofre, que está doente. Estar ao lado de um animal que sofre, que está doente. Amar, ajudar, curar."

"Ao fim da visita, o cacique me convidou para jantar numa estrela. Achei aquilo uma coisa linda...", comentou Nise. Tomaram-se amigos.
Sempre que vinha de sua tribo para o Rio de Janeiro, ele a visitava. Outro momento importante, na amizade da dama do inconsciente e de José Luís, foi quando o índio a presenteou com um cocar grande e vistoso, multicolorido. Na ocasião, o filho decidiu que ela não seria somente sua mãe, mas sim mãe da natureza. Ao receber o presente, deu-se uma cena desconcertante: o xavante, solenemente, colocou o cocar na cabeça da notável anciã, que disse sentir-se coroada. A Dra. conta: "Então, ele me explicou que a pena maior, a azul, representa o céu, pela cor e pela autoridade. Outra coisa: aquela que é mãe da natureza é também cacique. Sendo assim, eu fui graduada: agora, sou cacica da natureza..."

No final da visita, a senhora das imagens surpreendeu o filho adotivo: pediu asilo existencial ao povo xavante. Comentou que não sentia mais vontade de estar na civilização. Estava cada vez mais apegada aos animais. Desejava ir para a floresta... Ela prossegue: "Eu lhe confessei que estou cansada do mundo dos brancos. Aí, pedi: 'Me leve com você para a floresta dos Índios...’ O cacique me respondeu que gostaria de me levar, mas isso não é possível. Explicou-me que eu não agüentaria a viagem. É muito desgastante. Depois de ir até Brasília, de avião, é preciso pegar um outro avião e, chegando lá, tem muito chão pela frente - a estrada é de terra... Sim, eu entendi. Nasci neste mundo, e devo morrer aqui. Ontem, o José Luís voltou para a sua tribo."

Tempos depois do episódio, Nise fez um mea culpa diante dos membros do Grupo de Estudos, citando o xavante. Após chegar visivelmente abalada, na biblioteca, interrompeu a leitura e disparou:
"Peguem a ata da reunião de hoje e escrevam o que vou dizer agora: quando aceitei ser mãe xavante, o cacique José Luís repetiu que minha função é proteger todos os bichos, os vegetais e as criaturas. Eu aceitei. Pois bem: digam a ele que cometi um erro terrível. Falhei na minha função de ser mãe... Contem ao xavante o que aconteceu aqui. Faz algum tempo, um de meus gatos passou mal, adoeceu. Então, chamei o veterinário e dei pessoalmente o remédio pra ele. Às duas da madrugada, fraquejei e tive a impressão de que era um caso perdido. Desci para
o meu quarto, a pedido das acompanhantes - foi uma falha fatal da mãe xavante. O gato amanheceu morto. Agora, eu estou sofrendo com isso - sofro por ter abandonado o gato naquela madrugada. Sofro pela minha falha como mãe. Me arrependo e declaro a todos vocês. Isto é uma confissão pública. Escreveram tudo o que eu disse? Passe a ata pra cá - vou assinar embaixo."

Horta, Bernardo Carneiro in: Nise: arqueóloga dos mares

Veja também: Dia do Psicólogo

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O Poeta e o Juiz

Em Cachoeiro de Itapemirim (ES) o povo ergueu na praça principal o busto de um poeta. E esculpiu nesse busto versos do poeta. O poeta chama-se Newton Braga, tão universal e humano quanto seu irmão, o cronista Rubem Braga, embora menos conhecido do que este porque escolheu residir na sua terra natal.

O primeiro aspecto a realçar é que a homenagem máxima da cidade foi fruto de uma subscrição popular. Centenas de pessoas assinaram a lista de doações tendo havido contribuições minúsculas, algumas destas sumamente expressivas porque os signatários colocaram toda a força da alma ao assinar. Destaque-se ainda que não se tributava honra a um homem de poder, como é bem mais comum ocorrer.

Os versos esculpidos no granito são os versos finais do poema “Fraternidade”:

 Esta sensibilidade, que é uma antena delicadíssima,
 captando pedaços de todas as dores do mundo,
 e que me fará morrer de dores que não são minhas.

Vejo uma identidade entre o juiz e o poeta. O juiz também morre de dores que não são suas. Deve ser capaz de viver o drama dos processos, descer às pessoas que julga, incorporar na alma a fome de Justiça do povo a que serve.

O juiz haverá de ser um misto de juiz e poeta, não com o sentido pejorativo que se desse a essa fusão. Mas com o verdadeiro sentido que há em ver como atributos da Justiça a construção da Beleza, obra do artista, e a construção do Bem, obra do homem que procura trilhar o caminho da virtude.
  
Diverso e oposto desse paradigma de juiz seria o juiz distante, distante e equidistante, cuja pena se torna para ele um peso, não por sentir as dores que não suas, mas pelo enfado de julgar, pela carência do idealismo e da paixão que tornariam seu ofício uma aventura digna da dedicação de uma existência.
  
A lei como instrumento de limitação do poder é um avanço da cultura humana, caracteriza o Estado de Direito.

Mas a tábua de valores de um povo não está apenas na lei. Está sobretudo no estofo moral dos aplicadores da lei. Não há arquitetura política, sistema de freios do poder, concepção de instâncias superpostas a permitir a utilização de recursos, não há enfim engenharia processual que assegure a um povo tranquilidade e Justiça se os juízes forem corruptos, preguiçosos, egoístas, estreitos, sem abertura para o social, ciosos apenas de suas vaidades.

O juiz-poeta será aberto ao universal porque a Poesia descortina os horizontes do mundo e rompe com as estreitezas.
  
Aberto ao universal, terá do Direito uma visão sistêmica, percebendo a relação do Direito com os outros saberes humanos. Portador de cultura ampla, impulsionado pela Poesia a ver sempre além, terá consciência de seu papel social, mediador de culturas num Brasil plural.
  
O juiz-poeta cultivará o estudo, o trabalho intelectual, os livros. Seguirá o conselho de Olavo Bilac: “Longe do estéril turbilhão da rua, Beneditino escreve! No aconchego do claustro, na paciência e no sossego, trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!

O juiz-poeta não se fechará no estreito mundo do jurídico e menos ainda no estreito mundo de códigos e leis interpretados literalmente. Abrirá as janelas para enxergar toda a complexidade dos problemas humanos, pensará sempre nas consequências sociais de suas decisões. Nunca lavará as mãos, como Pilatos, jogando sobre o legislador a culpa por sentenças que, a seu próprio critério, sejam profundamente injustas, sem o esforço de buscar caminhos de interpretação para que prevaleçam, nos julgados, os valores éticos que a própria Constituição Federal coloca como parâmetros da organização social brasileira, como muito bem analisou em livro o jurista gaúcho Juarez Freitas.
  
Um juiz e uma Justiça que participem do esforço de superação das injustiças estruturais, isto é o que se espera como programa de ação de um Judiciário sensível e vigilante. Em síntese: juízes-poetas que se desdobrem para fazer da Justiça uma obra de Poesia e de Grandeza.



HERKENHOFF, João Baptista. O poeta e o juiz. Disponível em http://www.lfg.com.br - 01 de dezembro de 2010.

*Os grifos são meus.

Dedicado à Juíza Paula Fernandes Machado de Freitas


domingo, 14 de agosto de 2011

Da caixinha dos afetos...

Papai partiu há 35 anos e durante esses anos seu relógio esteve guardado na caixinha dos afetos. Tinha o vidro quebrado: sua máquina parou com o tempo ou terá sido pela falta do dono?
Vezenquando olhava para ele e pensava que um dia encontraria alguém para o consertar.
Há 15 dias o entreguei a um relojoeiro com a recomendação de que fosse muito cuidadoso ao manuseá-lo.
Ontem, quando fui buscá-lo, não parava de o admirar.
Ouvir o som dos ponteiros foi como ouvir o coração de papai palpitando.
Emoção indescritível!
12-07-2011

Regina Coeli Carvalho
Publicado no Recanto das Letras em 13/07/2011
Código do texto: T3092229

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

1 ano sem Joanna Marcenal


Sua presença é muito importante!
Será na véspera do dia dos pais, dia que nos traz recordações de nossa infância, do carinho recebido e não podemos ficar imune ao sofrimento dessa criança vítima de maus tratos da madrasta e de seu pai biológico, que se encontram livres e debochando daqueles que clamam por justiça.
Saiba mais sobreo caso e assine a petição públuca clicando nos links abaixo.