sábado, 31 de dezembro de 2011

Novo Ano...


 Imagem: Liniers
 
"Parece que existe no cérebro uma zona específica, que poderíamos chamar memória poética, que registra o que nos encantou, o que nos comoveu o que dá beleza à nossa vida." Milan Kundera, In A Insustentável Leveza do Ser

Durante o ano de 2011 não foram poucos os tropeços, alguns sofreres, algumas dores, porém minha “memória poética” registrou muitos momentos agradáveis, novos amigos juntando-se a lista dos amigos de uma vida, muito carinho recebido, reencontros com ex-alunos queridos, surpresas e alegrias da filha, família se realinhando novamente.

Agradeço e celebro a Vida.
Agradeço aos amigos ao meu redor que me emprestam asas no momento que as minhas estão impedidas de voar.
Agradeço o carinho manifestado em várias situações de dificuldades.
Agradeço aqueles que gritaram comigo quando as injustiças me incomodavam.

Peço emprestado a amiga Ana Jácomo o trecho abaixo e faço minhas as suas palavras.
“Para o ano novo, se eu conseguir ser nova, quero o sabor de saber, na prática, que somos feitos para a felicidade. Para a troca. Para a paz. Para a bondade. Para facilitarmos a existência uns dos outros. Para a coragem e a alegria de simplesmente ser”.

Que possamos ser:
A mão estendida,
O braço que abraça,
O colo que acolhe e
O coração que abriga.

Meu carinho,
Regina Coeli Carvalho


sábado, 24 de dezembro de 2011

Abaixo o Natal....


Abaixo o Natal!
do presente obrigatório,
compulsório,
de ceia-velório
e frio coração.

Abaixo o Natal!
do presunto fraticida
da mesa fingida,
noz ressequida.

Abaixo o Natal!
da neve de algodão
bolota na árvore
e frio coração.

Abaixo o Natal!
da criança sem teto
rodando nas esquinas
sem abrigo e afeto.

Abaixo o Natal!
que acorde de seu sono
escondido, em eclipse
ou como o sujeito
oculto por elipse
o espírito de Natal.

Desconhecido íntimo
em prosa cantado
sempre olvidado
faça aparição.

Recolha dos caminhos
a criança sem ninho.
Dê-lhe
pão, teto e vinho
então....Sim
Viva o Natal!
Edda Vianna Nesi, In Vinte Poetas à procura de um leitor

Que possamos vivenciar o espírito natalino de confraternização e acolhimento durante todo o ano sem necessidade de datas especiais.
Meu abraço carinhoso.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Tem um brinde esperando por você....


Uso esse espaço para compartilhar poesias que me tocam, indignações que me machucam, alguns rabiscos nas noites de insônia e um pouco do meu cotidiano.
Nunca tive a pretensão de ter vários seguidores/leitores - funciona para mim como um diário virtual.
Ultimamente, ele tem estado um pouco abandonado, ando em dívida com os amigos que me visitam e deixam seus comentários.
Aos poucos, venho retomando minhas atividades de “pseudo-blogueira”.
Tive três pensamentos selecionados para o Livro da Tribo 2012 (para aqueles que não conhecem é uma agenda poética). A cada dia uma poesia e/ou reflexão.
Meus direitos autorais foram “pagos” com alguns exemplares da agenda. Presenteei algumas pessoas queridas e reservei um exemplar para sortear entre meus poucos e fiéis leitores.
Caso você queria participar do sorteio deixe seu comentário nessa postagem.
No dia 1º de janeiro estarei sorteando a pessoa contemplada. Posteriormente entro em contato para anotar o endereço para remessa.
Boa sorte!
Carinhoso abraço.

sábado, 17 de dezembro de 2011

O yorkshire torturado pela enfermeira e a morte por tortura de Joanna Marcenal








Não tenho animal, mas não aceito que se maltrate qualquer bichinho.
Fiquei indignada com o caso da enfermeira e a tortura de seu cãozinho. Assinei a petição e divulguei na minha página do facebook.
Andei lendo muita indignação, ódio, montagens que se multiplicam pelas redes sociais.
Gostaria MUITO de ver a sociedade também mostrar sua indignação pela tortura e morte da menina Joanna Marcenal de apenas 5 anos, cujos acusados seu pai e madrasta continuam soltos ele trabalhando no Tribunal de Justiça.
Será que nossos valores estão invertidos?
Qualquer tipo de violência deve ser combatida e expurgada de nosso meio.
Aproveitem à indignação e visitem o blog do Caso JoannaMarcenal e conheçam a história macabra e seus apadrinhamentos.
Assinem também a Petição Pública.
Crianças e animais são indefesos e necessitam de nosso apoio e nossa indignação.
Que a JUSTIÇA se faça presente em ambos os casos.

sábado, 26 de novembro de 2011

Esperança



Esperança

Muitos são os que carregam
água na peneira,
como disse o poeta
 Manoel de Barros,
e esperança como estrela
na lapela.
Muitos são os que acreditam
em coisas simples e limpas,
em coisas essenciais,
amor, amizade, delicadeza,
paz,
e tantas outras palavras,
antigas e urgentes.

Roseana Murray, In:  Manual da Delicadeza de A a Z.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

A "igreja invisível"


Meus pais me ensinaram que religião é praticada quando saímos das pregações e colocamos em prática o que ouvimos.
Repetir orações decoradas, pregar e agir de formas diferentes é o que mais se vê nesse mundo de “meu deus”.
Quero continuar sendo membro da igreja invisível.

(...)
 "Igreja invisível" é o conjunto de pessoas, por esse mundo afora, gente que a gente nunca viu nem verá que, sem que a gente saiba, se comove com as mesmas coisas que a gente. Quem se alegra com a mesma coisa que me trás alegria é meu irmão. Quem chora pela mesma coisa que me faz chorar é meu irmão. Quem acha bonita a mesma música que eu acho é meu irmão. Há um verso de Fernando Pessoa que diz assim: "... E a melodia que não havia, se agora a lembro, faz-me chorar." Pois essa "igreja invisível" (que nada tem a ver com igrejas, bispos e dogmas) é um coral que canta uma melodia inaudível que enche o universo. Especialmente em momentos de grande solidão a gente a ouve - e isso nos dá grande alegria e nos faz chorar: não estamos sós.
(...)
Rubem Alves, trechos de “Asas para quem quer voar”

Aos amigos de caminhada que fazem parte dos membros da minha "igreja invisível" e se fazem presente com ouvidos, voz e coração.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Celebrar a morte deles...


Hoje é dia de finados.
Que esse dia, um dia, se torne dia de celebração:
por ter morrido
minha prepotência,
meu comodismo,
meus vícios de linguagem;
o medo que paralisa,
as relações demasiadamente mornas
e minha auto-sabotagem.
Anaclara de Castro

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Carta para Joanna Marcenal

Joanninha,
Infelizmente não a conheci em vida, mas aprendi a lhe amar através das suas fotos, das histórias contadas pela sua mamãe. Pela sua garra em permanecer em coma durante 26 dias para que a verdade pudesse vir à tona.
Mundo cruel esse em que você viveu durante cinco anos, onde pessoas maltratam crianças para se vingarem da rejeição.
Falsos profetas pregam a paz, mas seus comportamentos diabólicos denunciam suas mentes perversas.
Pessoas que se acham poderosas são cúmplices de crimes hediondos, porém todos trazem na testa a marca da tortura.
Hoje é seu aniversário - uso o presente, pois você permanece VIVA no coração de todos que lhe amam! Faz 7 anos que você nasceu para trazer alegria para família Marcenal.
Nessa cartinha, segue meu compromisso em lutar por JUSTIÇA independente de qualquer ameaça ou dificuldade que surja no caminho.
Joanna Marcenal, hoje você é a filha de todos que querem acreditar na imparcialidade dos que fizeram o juramento de exercer com dignidade e independência defendendo a Constituição, os direitos humanos, a justiça social e a boa aplicação das leis.
Nós continuamos a lutar por um mundo mais digno e humano, por uma sociedade ética e um poder judiciário que sacie a fome e a sede de justiça.


Leia também:




Regina Coeli Carvalho
Publicado no Recanto das Letras  em 20/10/2011
Código do texto: T3287119

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Mentes Perigosas: o Psicopata Mora ao Lado


Da série leitura imperdível:


Alguns trechos:

O psicopata sabe exatamente o que está fazendo. Ele tem um transtorno de personalidade. É um estado de ser no qual existe um excesso de razão e ausência de emoção. Ele sabe o que faz, com quem e por quê. Mas não tem empatia, a capacidade de se pôr no lugar do outro.

Como animais predadores, vampiros ou parasitas humanos, esses indivíduos sempre sugam suas presas até o último limite improvável de uso e abuso. Na matemática desprezível dos psicopatas, só existe o acréscimo  unilateral e predatório, e somente eles são os beneficiados.

A piedade e a generosidade das pessoas boas podem se transformar em uma folha de papel em branco assinada nas mãos de um psicopata.
Quando sentimos pena, estamos vulneráveis emocionalmente, e é essa a maior arma que os psicopatas podem usar contra nós.

Para os psicopatas, as outras pessoas são meros objetos ou coisas, que devem ser usados sempre que necessários para a satisfação do seu bel-prazer.

Um psicopata, quando “perde o controle”, sabe exatamente até onde ele quer ir, no sentido de magoar, amedrontar ou machucar uma pessoa.

Os psicopatas não vão ao trabalho, vão à caça.

Os psicopatas são seres sem “coração mental”.
Seus cérebros são gelados.

Não negocie com o mal. Jamais concorde, seja por pena, chantagem ou por qualquer outro motivo, em ajudar um psicopata a ocultar seu verdadeiro caráter.

É mais sensatos falarmos em ajuda e tratamento para as vítimas dos psicopatas do que para eles mesmos.

A luta contra a psicopatia é a luta pelo que há de mais humano em cada um de nós.

Ana Beatriz Barbosa Silva, Mentes Perigosas: o Psicopata Mora ao Lado. Editora Fontanar


terça-feira, 4 de outubro de 2011

E você?


A palavra é uma roupa que a gente veste.
Uns usam palavras curtas.
Outros usam roupa em excesso.
Existem os que jogam palavra fora.
Pior são os que usam em desalinho.
Uns usam palavras caras.
Poucos ostentam palavras raras.
Tem quem nunca troca.
Tem quem usa a dos outros.
A maioria não sabe o que veste.
Alguns sabem mas fingem que não.
E tem quem nunca usa a roupa certa para a ocasião.
Tem os que se ajeitam bem com poucas peças.
Outros se enrolam em um vocabulário de muitas .
Tem gente que estraga tudo que usa.
E você, com quais palavras se veste?
Com quais palavras você se despe?
Vivane Mosé

domingo, 2 de outubro de 2011

Assombrado


 Imagem de autoria desconhecida

Ainda que me falem
de barulhos
e de correntes
que se arrastam
pela noite...
Ainda que me contem
sobre almas errantes
e seres sinistros
que nos querem – em vão desejo!
Não!
Não temo os fantasmas.
Eu tenho medo
é dos políticos!
Ney Mourão

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Ponto Nevrálgico

Foto: Minha

Às cinco horas da tarde
sobe-se e desce-se o Chiado
bebe-se chá no Chiado
bebe-se o ar do Chiado
come-se nas montras do Chiado
conversa-se no Chiado
conversa-se do Chiado
literatura-se no Chiado
figura-se no Chiado
Chiada-se.

Mendes de Carvalho

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Ele era uma criança de apenas 10 anos...


Ele era uma criança de apenas 10 anos...
Estamos todos estarrecidos com a tragédia ocorrida em São Caetano do Sul com uma criança de 10 anos.
Precisamos estar atentos aos sinais que são emitidos por crianças, jovens, adultos no decorrer de sua existência. Sinais são dados.  Pais, familiares, professores devem educar seu olhar para perceber o que está por trás de determinados comportamentos do outro a nossa volta.
Percebo pais que só atendem aos sinais de compras: filho pede para ir ao shopping para o mais novo lançamento de determinado brinquedo; pais imediatamente vão às compras. Exibir a mais nova fantasia de herói, o mais novo celular, o iPod atualizado e outras geringonças eletrônicas estão na lista de prioridades.
E o olhar generoso sobre sentimentos do filho, por onde anda?
Não estou emitindo nenhum juízo de valores sobre o acontecido, não conheço a história de vida do menino nem as condições em que vivia. Porém, surge a necessidade de um olhar reflexivo de como estamos educando nossos filhos. Qual a qualidade de tempo que estamos dispensando para suas necessidades emocionais?
Reflexão pertinente ao momento que vivemos em que o TER substitui o SER na maioria dos casos.
Conversar com o filho, procurar entender suas dificuldades, acariciar, aconchegar nos momentos de tristeza e saber dizer não na hora certa são formas de amar.
Repensar valores, jogar fora os lixos existenciais que carregamos, re-começar pode ser um caminho para um futuro mais saudável para nossas crianças.

Regina Coeli Carvalho
Publicado no Recanto das Letras em 23/09/2011
Código do texto: T3236453

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Carta para o Caio


Querido Caio,
Hoje é seu aniversário.
De repente, senti uma vontade imensa de escrever pra você.
Tenho o maior orgulho de ser sua contemporânea. Quando li “Limite branco” e “O ovo apunhalado”, ainda adolescente, confesso que não entendi muito bem - estava na fase romântica, sua ironia em alguns trechos não foram bem captadas por mim. Mas algo ficou no ar. A vontade de ler posteriormente com mais tempo e disposição (acredito que nascia, ainda que inconsciente, uma vontade de o conhecer melhor).
Mais madura, percebi outro Caio, diferente daquele que minha percepção foi capaz de absorver inicialmente.
Desde então li tudo que você escreveu: tenho na minha estante o “Cantinho do Caio”, logo abaixo do “Cantinho do Pessoa” - os outros autores estão juntos e misturados.
No exercício do magistério, incentivei muitos jovens a ler a  sua obra, embora não seja professora de Literatura, acredito que os significados psicológicos que sua escrita contém são caminhos indispensáveis para ajudar no olhar para o outro.
Em 2009, quando do lançamento do livro da Paula Dip, estava de viagem marcada para Portugal. Sem poder esperar para ler “Para sempre teu, Caio F.", dei uma escapa na Livraria da Travessa, a única onde o poderia comprar num domingo de manhã.
Não senti as horas de viagem. A leitura de suas cartas me fizeram viajar para outro mundo: o das pessoas sensíveis, delicadas, gentis, irônicas, que estão sempre prontas para o outro e abertas para o amor. Assim é (era?) você.
Você afirmou: “Queria tanto que alguém me amasse por alguma coisa que escrevi”. Hoje há uma geração que nem era nascida quando você começou a escrever e que lhe venera; trechos de sua obra nas redes sociais, nos blogs, nas dedicatórias e por ai afora.
Se você ainda estivesse entre nós sofreria muito com tanta violência, corrupção, hipocrisia, injustiças, discriminações. Talvez, sua sensibilidade o levaria para outro caminho da escrita: o das denúncias.
Não sei.
Como você, "Ando bem, mas um pouco aos trancos. Como costumo dizer, um dia de salto 7, outro de sandália havaiana".
Com todos os tropeços, continuo seguindo a sua máxima: “Um amigo me chamou para ajudá-lo a cuidar da dor dele...Guardei a minha no bolso. E fui.”
Fique bem.
"Vai um cheirinho de alecrim e muito carinho",
Regina Coeli Carvalho

“Tenho pena das pessoas que não escrevem cartas.”
“A gente não deve permitir que as cartas se tornem obsoletas, mesmo que, talvez, já tenham se tornado.”
Caio Fernando Abreu

Dedico essa homenagem ao Paulo César, meu ex-aluno, filho do coração, que de Berlim me envia cartas. Quando o presenteei com "Para sempre teu". Caio F., livro da Paula Dib, publicação das cartas trocadas entre eles, meu lindinho falou: "Vamos guardar nossas cartas, quem sabe publicaremos um livro." Estou em débito, ele escreve mais do que eu.

Regina Coeli Carvalho
Publicado no Recanto das Letras em 12/09/2011
Código do texto: T3216079

sábado, 27 de agosto de 2011

Cleyde Prado Maia


Amiga,
Onde quer que você esteja receba minha saudade.

À Doutora dos Afetos

 Imagem daqui:

Hoje, dia do psicólogo, deixo minha eterna gratidão a Dra. Nise da Silveira, psiquiatra que olhava o ser humano antes de enxergar a doença.
Através de meu pequeno contato como estagiária, de sua obra, da leitura e releitura constante de suas lições de vida cresci como pessoa e profissional.
Compartilho com vocês uma das passagens de sua vida narradas no livro Nise: arqueóloga dos mares por Bernardo Carneiro Horta.

Aos 90 anos, foi coroada com cocar de cacique. Um xavante convidou-a para ser sua mãe

Idosa, Nise se comovia cada vez mais com suas histórias - não somente as antigas, mas também as daquela ocasião.

"Ontem, me aconteceu uma coisa: dois índios vieram me visitar. Fato curioso... Nós conversamos, almoçamos e tudo foi muito agradável. No dia seguinte, um deles foi embora. Mas, para minha surpresa, o outro retornou e me disse: 'Sonhei com minha avó e ela pediu para que eu voltasse aqui e convidasse a senhora para ser mãe xavante - minha mãe...' Nem é preciso dizer que fiquei impressionadíssima com tal convite!", contou a Dra.

Este índio se chama José Luís Tsereté. É cacique xavante e foi apresentado à Nise pela antropóloga May Waddington, amiga e participante do Grupo de Estudos C.G.Jung. O fato emocionou a psiquiatra, pois aquele índio de 45 anos de idade tocara num ponto especial: a maternidade. A Dra. não teve filhos... Como se não bastasse, o convite, por sincronicidade, lhe chegou no dia das mães. Então, o xavante já adulto, perante a anciã, perguntou em tom oficial: "A senhora aceita ser minha mãe?" Ela se comoveu. Aos noventa anos, era a primeira vez que alguém a chamava, tão diretamente, de mãe.

De pé, vestido de calças jeans, camiseta e cocar, José Luís esperava atentamente pela resposta. A mulher lhe disse: "Sim. Eu aceito. Mas quero saber quais são as obrigações de uma mãe xavante." Ele revelou: "Estar ao lado de uma pessoa que sofre, que está doente. Estar ao lado de um animal que sofre, que está doente. Amar, ajudar, curar."

"Ao fim da visita, o cacique me convidou para jantar numa estrela. Achei aquilo uma coisa linda...", comentou Nise. Tomaram-se amigos.
Sempre que vinha de sua tribo para o Rio de Janeiro, ele a visitava. Outro momento importante, na amizade da dama do inconsciente e de José Luís, foi quando o índio a presenteou com um cocar grande e vistoso, multicolorido. Na ocasião, o filho decidiu que ela não seria somente sua mãe, mas sim mãe da natureza. Ao receber o presente, deu-se uma cena desconcertante: o xavante, solenemente, colocou o cocar na cabeça da notável anciã, que disse sentir-se coroada. A Dra. conta: "Então, ele me explicou que a pena maior, a azul, representa o céu, pela cor e pela autoridade. Outra coisa: aquela que é mãe da natureza é também cacique. Sendo assim, eu fui graduada: agora, sou cacica da natureza..."

No final da visita, a senhora das imagens surpreendeu o filho adotivo: pediu asilo existencial ao povo xavante. Comentou que não sentia mais vontade de estar na civilização. Estava cada vez mais apegada aos animais. Desejava ir para a floresta... Ela prossegue: "Eu lhe confessei que estou cansada do mundo dos brancos. Aí, pedi: 'Me leve com você para a floresta dos Índios...’ O cacique me respondeu que gostaria de me levar, mas isso não é possível. Explicou-me que eu não agüentaria a viagem. É muito desgastante. Depois de ir até Brasília, de avião, é preciso pegar um outro avião e, chegando lá, tem muito chão pela frente - a estrada é de terra... Sim, eu entendi. Nasci neste mundo, e devo morrer aqui. Ontem, o José Luís voltou para a sua tribo."

Tempos depois do episódio, Nise fez um mea culpa diante dos membros do Grupo de Estudos, citando o xavante. Após chegar visivelmente abalada, na biblioteca, interrompeu a leitura e disparou:
"Peguem a ata da reunião de hoje e escrevam o que vou dizer agora: quando aceitei ser mãe xavante, o cacique José Luís repetiu que minha função é proteger todos os bichos, os vegetais e as criaturas. Eu aceitei. Pois bem: digam a ele que cometi um erro terrível. Falhei na minha função de ser mãe... Contem ao xavante o que aconteceu aqui. Faz algum tempo, um de meus gatos passou mal, adoeceu. Então, chamei o veterinário e dei pessoalmente o remédio pra ele. Às duas da madrugada, fraquejei e tive a impressão de que era um caso perdido. Desci para
o meu quarto, a pedido das acompanhantes - foi uma falha fatal da mãe xavante. O gato amanheceu morto. Agora, eu estou sofrendo com isso - sofro por ter abandonado o gato naquela madrugada. Sofro pela minha falha como mãe. Me arrependo e declaro a todos vocês. Isto é uma confissão pública. Escreveram tudo o que eu disse? Passe a ata pra cá - vou assinar embaixo."

Horta, Bernardo Carneiro in: Nise: arqueóloga dos mares

Veja também: Dia do Psicólogo

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O Poeta e o Juiz

Em Cachoeiro de Itapemirim (ES) o povo ergueu na praça principal o busto de um poeta. E esculpiu nesse busto versos do poeta. O poeta chama-se Newton Braga, tão universal e humano quanto seu irmão, o cronista Rubem Braga, embora menos conhecido do que este porque escolheu residir na sua terra natal.

O primeiro aspecto a realçar é que a homenagem máxima da cidade foi fruto de uma subscrição popular. Centenas de pessoas assinaram a lista de doações tendo havido contribuições minúsculas, algumas destas sumamente expressivas porque os signatários colocaram toda a força da alma ao assinar. Destaque-se ainda que não se tributava honra a um homem de poder, como é bem mais comum ocorrer.

Os versos esculpidos no granito são os versos finais do poema “Fraternidade”:

 Esta sensibilidade, que é uma antena delicadíssima,
 captando pedaços de todas as dores do mundo,
 e que me fará morrer de dores que não são minhas.

Vejo uma identidade entre o juiz e o poeta. O juiz também morre de dores que não são suas. Deve ser capaz de viver o drama dos processos, descer às pessoas que julga, incorporar na alma a fome de Justiça do povo a que serve.

O juiz haverá de ser um misto de juiz e poeta, não com o sentido pejorativo que se desse a essa fusão. Mas com o verdadeiro sentido que há em ver como atributos da Justiça a construção da Beleza, obra do artista, e a construção do Bem, obra do homem que procura trilhar o caminho da virtude.
  
Diverso e oposto desse paradigma de juiz seria o juiz distante, distante e equidistante, cuja pena se torna para ele um peso, não por sentir as dores que não suas, mas pelo enfado de julgar, pela carência do idealismo e da paixão que tornariam seu ofício uma aventura digna da dedicação de uma existência.
  
A lei como instrumento de limitação do poder é um avanço da cultura humana, caracteriza o Estado de Direito.

Mas a tábua de valores de um povo não está apenas na lei. Está sobretudo no estofo moral dos aplicadores da lei. Não há arquitetura política, sistema de freios do poder, concepção de instâncias superpostas a permitir a utilização de recursos, não há enfim engenharia processual que assegure a um povo tranquilidade e Justiça se os juízes forem corruptos, preguiçosos, egoístas, estreitos, sem abertura para o social, ciosos apenas de suas vaidades.

O juiz-poeta será aberto ao universal porque a Poesia descortina os horizontes do mundo e rompe com as estreitezas.
  
Aberto ao universal, terá do Direito uma visão sistêmica, percebendo a relação do Direito com os outros saberes humanos. Portador de cultura ampla, impulsionado pela Poesia a ver sempre além, terá consciência de seu papel social, mediador de culturas num Brasil plural.
  
O juiz-poeta cultivará o estudo, o trabalho intelectual, os livros. Seguirá o conselho de Olavo Bilac: “Longe do estéril turbilhão da rua, Beneditino escreve! No aconchego do claustro, na paciência e no sossego, trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!

O juiz-poeta não se fechará no estreito mundo do jurídico e menos ainda no estreito mundo de códigos e leis interpretados literalmente. Abrirá as janelas para enxergar toda a complexidade dos problemas humanos, pensará sempre nas consequências sociais de suas decisões. Nunca lavará as mãos, como Pilatos, jogando sobre o legislador a culpa por sentenças que, a seu próprio critério, sejam profundamente injustas, sem o esforço de buscar caminhos de interpretação para que prevaleçam, nos julgados, os valores éticos que a própria Constituição Federal coloca como parâmetros da organização social brasileira, como muito bem analisou em livro o jurista gaúcho Juarez Freitas.
  
Um juiz e uma Justiça que participem do esforço de superação das injustiças estruturais, isto é o que se espera como programa de ação de um Judiciário sensível e vigilante. Em síntese: juízes-poetas que se desdobrem para fazer da Justiça uma obra de Poesia e de Grandeza.



HERKENHOFF, João Baptista. O poeta e o juiz. Disponível em http://www.lfg.com.br - 01 de dezembro de 2010.

*Os grifos são meus.

Dedicado à Juíza Paula Fernandes Machado de Freitas


domingo, 14 de agosto de 2011

Da caixinha dos afetos...

Papai partiu há 35 anos e durante esses anos seu relógio esteve guardado na caixinha dos afetos. Tinha o vidro quebrado: sua máquina parou com o tempo ou terá sido pela falta do dono?
Vezenquando olhava para ele e pensava que um dia encontraria alguém para o consertar.
Há 15 dias o entreguei a um relojoeiro com a recomendação de que fosse muito cuidadoso ao manuseá-lo.
Ontem, quando fui buscá-lo, não parava de o admirar.
Ouvir o som dos ponteiros foi como ouvir o coração de papai palpitando.
Emoção indescritível!
12-07-2011

Regina Coeli Carvalho
Publicado no Recanto das Letras em 13/07/2011
Código do texto: T3092229

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

1 ano sem Joanna Marcenal


Sua presença é muito importante!
Será na véspera do dia dos pais, dia que nos traz recordações de nossa infância, do carinho recebido e não podemos ficar imune ao sofrimento dessa criança vítima de maus tratos da madrasta e de seu pai biológico, que se encontram livres e debochando daqueles que clamam por justiça.
Saiba mais sobreo caso e assine a petição públuca clicando nos links abaixo.







domingo, 31 de julho de 2011

Táxi em Movimento


Imagem: Google

Táxi em Movimento

Há um Táxi sempre em Movimento.
Trafega em excesso de velocidade:
nas notícias!
Viaja com carga em excesso:
Não de passageiros, mas de indignações!
Transborda pelas portas e janelas:
a solidariedade!
Corre na contramão atropelando
os corruptos!
Os demais veículos são multados
por infringirem as leis do trânsito,
o Táxi em Movimento
sofre censura por suas cobranças e denúncias.
Há um Táxi sempre em Movimento
ao alcance da nossa mão,
seu combustível é o coração!

Meu carinho ao Jorge Schweitzer do Táxi em Movimento por ser e estar sempre solidário com as injustiças sociais.

Como não sou poetisa pedi um socorro na correção para a amiga Ana Ferreira.